Era noite, enquanto todos dormiam, ela se
sentia mais viva, transparente e secreta, como se do alto ela tudo pudesse ver.
Adorava fazer a terra viver de verdade, verdade que ela gerava, mas ninguém enxergava.
Pensava consigo: para onde iam todos os sonhos que ela criava, será que eram
todos abortados, falíveis?
Era de uma
fragilidade imensa seu poder, seu querer, pois era sempre esquecida,
transparente, incolor. Ela ainda tão inocente, acreditava em contos de fadas,
em príncipe encantado.
Temia comer a
maçã envenenada.
Cautelosa era
para não perder o voo da imaginação.
Temia essa
realidade cruel.
Amava a vista
que tinha do nada.
Gostava da
brisa do vento que nunca chegara.
Gostava quando
a dor passava e mesmo assim sofria.
Queria ter
dentro dela uma alma, pois a vida por si só não lhe convinha.
Por quase todos
os momentos de sua vida, queria ser vista.
Queria ser uma
voz que desabafasse.
Querendo ser
tantas em uma só.
Uma dama, uma
rainha, a plebeia adormecida, do branco que desbotou.
Sua vida era
crescente, a cada dia mais próximo de outra vida.
Não pensava em
ser outra, se nem nesta vida podia ser alguém.
Só queria um
risonho-sereno, uma gargalhada rasgada no vento
Cheia de dor e
alento, vindo sem querer chegar em lugar algum.
Menino queria
ser.
Não amando, mas
sendo.
Querendo correr
e brincar sem ter em quem depositar o medo que guardara consigo.
Menino queria
ser.
Pois o desvio
do vento o deixaria com direção, para ir onde nunca pensasse
Onde o amor só
amasse e o medo medroso não o amedrontasse.
Queria apenas
sorrir.
Fingir que
amou.
Ter na vida o
que ela não quis.
Roubar seus
próprios sonhos e dormir como em todos os dias.
Ser perfeita na
imperfeição dos dias.
Levar uma vida
escorregadia.
E sofrer por
amor.
Sofrer sem dor,
sendo um menino sozinho, à espera de uma vida para viver.
Lembrando do
que queria esquecer.
por Brenda Oliveira.